terça-feira, 4 de setembro de 2018












                     Eu comecei a ouvir o barulho nervoso de suas mãos tocando em tudo, sacudindo tubos, caixas, recipientes, se estavam vazios. Amanheceu com a cachorra. Espírito de Amélia. Vai jogar muita coisa fora. É sempre assim, depois fica procurando e atribuindo aos outros, principalmente a mim, o sumiço. Suas mãos grandes e dedos longos futuca tudo e não me deixa dormir. Eu olho por debaixo da coberta. Pensa que estou dormindo. Reclama, murmura, indigna-se, com as coisas que guardo com tanto carinho. Uma diferença entre nós. O passado e o presente, não digo futuro, o futuro não existe, quando ele chega já é presente e logo passado, sem nenhum valor. Difícil compreender isto, daí a ansiedade. Ansiedade, sim. Incapaz de parar num canto, abrir um livro, ler. Ou mesmo pensar. Assim, se morre mais depressa. Pega um vasilhame, mexe nele, sacode-o e depois pega de uma tesoura,  abre-o. Põe seu conteúdo em um pote. Você não mais vai saber o que é aquilo. Nem ela, porque esquece. Vai na caixa de remédios, começa a recortar as cartelas, deixa um ou dois comprimidos que você não sabe o que é. Tudo perdido,  pra pubele.

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